O que Black is King, novo filme de Beyoncé, pode nos ensinar sobre a África?
Beyoncé é conhecida por seus projetos
grandiosos e, ao mesmo tempo, muito pessoais; quando entrou para o elenco do live
action de Rei Leão, no ano passado, sua função seria apenas dublar a personagem
Nala, um par romântico para o protagonista. Porém, ela se encantou com a
história, e decidiu transforma-la em um álbum completo, o The Gift, que agora, mais de um ano depois, é relançado no
streaming da Disney, como um filme completo nascido dessas canções e que se
banha na história da África para explicar o que significa ser negro no mundo de
hoje.
Nessa nova história, Simba é reimaginado como
um jovem príncipe tribal que é iludido pelas tentações da cidade grande, se
afastando de suas próprias origens no caminho – uma referência tanto aos negros
americanos que perderam suas origens após séculos de opressão, como às inúmeras
culturas africanas que acabam diminuídas frente às influências norte-americanas
e europeias.
Black is King desafia os estereótipos construídos ao redor da África como um continente apenas de pobreza, corrupção e tragédia e a reapresenta como um lugar milenar, formado por países com inúmeras tribos, etnias e dialetos que merecem ser ouvidos. Em clipes como Already, o filme reforça que antes da invasão europeia existiam reinos e impérios tão interessantes quanto a Era Vitoriana ou o mercantilismo, com um legado que resiste até hoje através de seus habitantes apesar de todas as adversidades – e isso deve ser reconhecido e celebrado pelo mundo.
O expectador desbrava essa
história junto de Simba, remontando desde os penteados usados por antigas
realezas, até a arquitetura de casas e ruas. Confúncio disse certa vez que a
melhor forma de prever o futuro é olhando para o passado e Beyoncé se apropria
dessa ideia para mostrar o quão poderoso é para os negros conhecerem as próprias
raízes e se orgulhar delas. Não existe uma única forma de ser africano ou
negro, nem uma única forma de se contar a história de um povo, por isso todos
merecem ocupar um espaço no trono.
Para acompanhá-la nesse projeto a cantora recrutou um grande time de artistas negros norte-americanos e africanos, que trouxeram um pouco de seu país e personalidade ao filme. Beyoncé soube dar lugar de fala para que eles ocupassem as faixas musicais com suas próprias batidas, melodias e cenários que remetiam ao continente. O resultado, se não agrada a todos, pelo menos não falha com a diversidade de vozes.
A obra também se expandiu para diversas
plataformas, gerando verdadeiras discussões online. Black is king cumpre seu objetivo quando usa da euforia nas redes
sociais para levantar debates e incentivar seu público a pensar fora do eixo
EUA-Europa. O projeto também gerou ressalvas, a socióloga Lili Schwarcz
que criticou o filme por glamourizar e mistificar a situação da África, um
comentário que depois foi mal recebido por ativistas que viram o filme como uma
democratização dos espaços de fala e não como exotização da África.
Nas palavras de Fabiana Moraes em sua coluna
para o Uol “A periferia, vejam só, não é necessariamente indigna, não é
necessariamente triste, não necessariamente fala aos berros. É também um espaço
no qual ocorre a felicidade. E, sim, deseja brilhar, como a maioria dos seres
humanos nascidos sobre à terra.”